Certo dia, conversando com meu amigo Marco, de Porto Alegre, ele revelou:
- Pô, finalmente acho que consegui criar aquele ‘espaço cultural’que estava planejando. A idéia é criar um ambiente com boa música, livraria e tudo o mais que for relacionado à cultura.
Pronto. Neste momento estava anunciado o nascimento da Galeria Dois Pontos.
Eu, imediatamente, animei-me com a idéia e perguntei:
- Nossa, que maravilha! Você precisa botar um samba nesse lugar!!!
E ele:
- Claro, não tenhas dúvida. Esse é o objetivo, aliás, o pessoal do Jequitibá não anima vir para cá??? Vamos armar uma bagunça??? - Eu logo respondi:
- Ah, anima, claro. Mas temos que planejar direitinho, né?
Neste momento, Marco desabafou:
- Pois, é, eu realmente queria um samba de verdade aqui no espaço, porque aqui em Porto Alegre as coisas são mais complicadas.
Mais do que rapidamente, eu lancei:
- Pô, mas e o pessoal do Resgate? Eles têm um projeto muito bacana, fazem um samba bonito, samba de terreiro mesmo.
O Marco ainda não conhecia o Projeto Resgate mas logo se empolgou com a idéia. Passei os contatos do Fernandinho e quando me dei conta, a roda e a parceria estavam mais do que formadas.
No dia seguinte ao samba, o Marco apareceu novamente:
- Maíra, tu precisavas ter visto. Foi lindo o samba ontem. O pessoal do Resgate é massa! Agora mais do que nunca vocês têm que vir!
Aí, de fato, era o momento de estreitar os laços, conferir de perto aquela rapaziada que luta diariamente pelo samba verdadeiro, num lugar em que há pouco espaço e reconhecimento. São dezesseis “quixotes” a duelar contra seus moinhos de vento.
Em seguida, iniciamos a procura por passagens e outros “companheiros” para mais uma jornada em prol do samba. Fechado: no dia 2 de abril o Jequitibá aterrisaria em terras gáuchas. Como o tempo era curto e a vida é dura, desta vez, conseguimos reunir apenas 4 integrantes: Daniel, Lêda, Luciano e Maíra.
O grande dia chegou. Fomos super recepcionados por Marco e Eva, sua esposa, que carrega no ventre nosso futuro sambista Davi.
Finalmente chegamos à Galeria Dois Pontos. De fato, como prometido, o espaço é um misto de livraria com boteco. Um lugar para se apreciar música de boa qualidade e mais, para se inspirar!
Todos os móveis foram praticamente arquitetados e fabricados pelos donos. Tudo militricamente planejado e projetado. Desde os bancos de chita, o liquidificador antigo que virou uma luminária, os banheiros recheados de edições raras do Pasquim e outros jornais.....Ah, e o altar do samba, claro, confeccionado pessoalmente por Eva. Um dentre os detalhes sincretistas da casa, num salve ao samba e ao negro!
Pois bem. Após algumas geladas, a rapaziada do Resgate começou a chegar. Era sexta-feira e o samba oficial apenas aconteceria no sábado. Havíamos planejado tomar umas, falar da vida, enfim conhecermo-nos um pouco melhor.
Foi chegando, um, outro, depois outro e mais outro....quando percebemos o samba já tinha começado. Em pouco tempo o couro já estava ‘comendo’. O samba de terreiro e partido-alto rolavam solto...
Outras figuras também apareceram, como Artur de Bem e Rosa, de Floripa, que foram até Porto Alegre para prestigiar o samba, dentre outros.
A batucada foi até a madrugada e só parou porque o dia seguinte prometia e os vizinhos já não estavam mais tão tolerantes ao samba...
Dito e feito. Sábado, como era de se esperar, logo cedo os integrantes do Resgate já estavam na Galeria, além de Artur, Rosa, o pessoal do Central do Samba e demais amantes daquilo que tanto nos alumia!
Aquele final de tarde que se estendeu durante a noite foi um momento de superação. O encontro foi mais do que harmônico, era como se nos conhecêssemos há tempos e o samba aconteceu como realmente deve ser: naturalmente, com muita alegria e simplicidade. Ah, e com muitas brasas, claro!
Da Galeria, emendamos para um, dois, três, botecos...enfim, aquela noite só terminou de manhã. E ainda assim, apenas porque precisávamos rumar para o aeroporto. Por pouco não perdemos o vôo, envolvidos pela embriaguez daquela aelgria e da própria bebida!