Dedicar-se ao samba às vezes pode parecer ingrato. Afinal, quantos negros pobres, pobres negros, ou simplesmente pobres ou negros já não morreram e ainda morrerão no desconhecimento e/ou esquecimento?
Ápio Patrocínio da Conceição é mais uma dessas figuras pouco conhecidas no mundo do samba.
O menino órfão, morador de rua, pobre, que trabalhou como engraxate, fundidor, vendedor de cadarço e estivador sai do anonimato para se tornar Camafeu de Oxóssi e ganhar alguma fama, ao se tornar proprietário da barraca de São Jorge, no velho Mercado Modelo e, posteriormente, de um renomado restaurante.
Foi exímio tocador de berimbau e freqüentador das rodas de samba de Salvador, na Bahia. Foi diretor das Escolas de Samba Gato Preto, Só Falta Você e Deixa Pra Lá, onde apresentava seus sambas.
Em sua barraca São Jorge, tocava seu berimbau e cantava músicas de capoeira, samba de roda e ijexá. Dessa forma, angariava mais clientes. O espaço era permeado pelo ritualismo, onde ele ensinava os mistérios da Bahia de todos os Santos.
Era cenário comum ver Camafeu no Mercado Modelo, saudando Oxóssi, cercado por seus orixás e pela população que visitava o local.
Na década de 60, cursou língua iorubá na Universidade Federal da Bahia, o que lhe rendeu um convite para participar do Primeiro Festival de Arte Negra do Senegal.
Camafeu foi citado em diversos livros de Jorge Amado, de quem tornou-se amigo íntimo, assim como em algumas canções, tais como “Camafeu”, de Martinho da Vila, que foi também gravada por Candeia, na qual se indaga:“ Camafeu, Cadê Maria de São Pedro ?” .
Gravou dois discos, onde deixou registrados preciosos cantos de capoeira, dos escravos e principalmente, parte da nossa história.
Em 1994, falece Ápio Patrocínio da Conceição, aos 78 anos. Desde então, o Mercado Modelo parece ter perdido um pedaço de seu encanto. Por lá já não se vêem mais a música, o canto, os ensinamentos e rituais de Camafeu.
Encerramos esta singela homenagem a esse grande representante de nossa cultura com a faixa “Moriô”, de seu disco “Berimbau da Bahia, bem como “Camafeu”, gravada por Candeia.
Os lírios do campo Vão morrendo, vão morrendo Ou amor se desmanchando E o chão se embrutecendo
Os lírios do campo vão morrendo E o amor se desmanchando E o chão se embrutecendo
Dê um sorriso Dê um sorriso e dê uma flor E muito amor, muito amor receberá Quanta ironia há nesta gente Suficiente, mas querem mais
Amigo, não deixe para amanhã O bem que tens para fazer agora Chegando a hora, vai prevalecer O bem, o mal há de vencer
Procure esconder, que o mundo é cheio de maldade Bondade é o que, só vejo falsidade A vida é um labirinto De ilusão e falso prazer Sem humildade não adianta viver
Semearás boa semente E o que plantares colherás Quanta ironia, não há pudor Mata e se morre negando o amor
Amigo não deixe para amanhã O bem que tens para fazer agora Chegando a hora vais prevalecer O bem o mal há de vencer.